Não pensar sai caro




Pouco mais de meio século separa estas duas vistas sobre a baixa de Albufeira – partilhadas através do Facebook. Nelas podemos observar o início da edificação da encosta, em meados da década de 1950, e a actual ocupação e impermeabilização do território antigamente afecto ao leito de cheia.

Um excelente artigo do engenheiro de ambiente Aurélio Nuno Cabrita, publicado no jornal regional Sul Informação, dá-nos conta da história conturbada da cidade onde tiveram lugar inundações com alguma intensidade nas décadas de 40 e 50 do século XX.
No mesmo jornal, o arquitecto paisagista Gonçalo Gomes reflecte sobre a ocupação desregrada do território daquela bacia hidrográfica, com índices muito elevados de impermeabilização, a par com o sub-dimensionamento e deficiente manutenção das infraestruturas de drenagem. Perante um cenário de forte carga, como aquele vivido no passado fim-de-semana, esta combinação adversa de factores revelou-se a receita para o desastre.

Importa ter presente que o cenário trágico que ali se verificou tem causas humanas – e que as responsabilidades ao Homem devem ser atribuídas. Em primeiro lugar, ao somatório de erros de ocupação do território durante várias décadas, fruto da ausência de uma cultura de planeamento e do laxismo de administradores locais, levados a reboque pela voragem imediatista da construção civil.
Depois a jusante, porque conhecendo-se bem as fragilidades consolidadas e os graus de perigo presentes, se conseguem ignorar os riscos durante anos ou décadas a fio, à espera da calamidade. Que ninguém se atreva a encolher os ombros como se de uma fatalidade se tratasse – e que ninguém permita que um político o faça. Estes problemas têm solução: faça-se o diagnóstico de toda a bacia hidrográfica, estabeleça-se um plano de drenagem adequado às solicitações presentes e ponha-se em prática.

É muito caro? Sim. Mas como nos permitimos levar a cabo operações de urbanismo cosmético, ascendendo a dezenas de milhões de euros, sobre territórios com tal vulnerabilidade, sem começar por abordar as carências infraestruturais que os afligem?
Não pensar sai caro – e somos nós todos que pagamos, nos nossos impostos, os prejuízos do luxo da ignorância. Como voltaremos a pagar agora, uma vez mais.

Conhecendo os constrangimentos orçamentais em que vive a maioria dos municípios portugueses, em especial no interior do país, sem acesso aos grandes programas de dita requalificação promovidos pelo Estado e quase sem acesso aos fundos europeus, ver um Polis levado literalmente por água abaixo é, perdoem o desabafo, difícil de suportar.

1 comentário:

  1. Muito bom, colega, eu diria antes "Pensar errado, dá merda. Porque neste pais temos pessoas que pensam, e que fazem coisas muito validas, o problema é que as decisões e o dinheiro encontram-se junto de um grupo de prepotentes que não tem nem capacidade para perceber que cada um percebe do seu trabalho. A malta do poder tem um gozo enorme em decidir depois de pensar errado.

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