[democratizar o design]

Quinta-feira



Uma banheira por oito mil euros. Uma cozinha por cinquenta mil. Tudo é possível no mundo do design de primeira qualidade.

Certa vez andava à procura de peças para casa de banho e a vendedora começa a apresentar-me um pequeno armário de apoio, para aí com 65 centímetros de altura e 40 de largo. Era claramente o Rolls-Royce dos armários de casa de banho, porta em vidro fôsco numa moldura em aço escovado encastrada numa peça de laminado de madeira de altíssima densidade, inalterável, impermeável e provavelmente sujeito a testes de impacto pela Nasa. Tudo, pela módica quantia de dois mil euros. E eu olhei para aquilo e pensei para mim: “caraças, mas isto é um armariozeco de casa de banho”. Claro que a peça era de uma limpeza irrepreensível, o design limpo e minimal, os materiais o melhor que o dinheiro pode comprar. Mas quatrocentos contos por um armário minusculo?

Felizmente, na área da decoração e do consumo em geral o aparecimento das grandes superfícies veio tornar acessível aquilo que em tempos se destinava apenas a alguns. Claro que há concessões a fazer: o design mais orientado para a produção em série, as madeiras e os laminados mais fracos, os aços de menor qualidade quando não mesmo substituídos por latão e alumínios, mas por outro lado são peças a preço apropriado ao seu tempo de vida. Sim, eu não quero um armário de casa de banho que dure até aos meus oitenta anos e passe para os meus netos. Eu só querro arrumar a pasta de dentes.

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1 comentário:

  1. Inclino-me a pensar que o valor atribuido a muitos dos artigos de design "exclusivo" são correlativos à chancela do designer; quer isto dizer, dizem mais respeito ao suposto estatuto social a que a sua aquisição remete do que à peça propriamente dita. Apesar da beleza, qualidade, solidez, etc. que eventualmente possuam. No entanto, há tempos um amigo neo-zelandês contou-me uma história curiosa. Um escultor japonês radicado na nova-zelandia, fascinado pelo mobiliário ocidental do qual não há tradição no Japão, desenvolveu uma série de peças de mobiliário. Entre elas, uma colecção de cadeiras, arrojadas mas muito pouco funcionais. Claro que cada uma destas peças se poderia desdobrar em múltiplas e vastas leituras. No entanto, numa entrevista, a jornalista (não são só os jornalistas portugueses) pergunta-lhe, muito escandalizada, se ele não considera uma exorbitância o preço de cada cadeira (uns quantos milhares de dólares), tendo em conta que qualquer pessoa por poucos dólares poderia adquirir meia dúzia das ditas em qualquer loja... e o escultor, imagino que com os globos oculares fora de órbita, respondeu-lhe: Mas minha senhora...isto NÃO É uma cadeira....é uma peça de arte!
    Moral da história, há que não confundir o género humano com o manuel germano como parodia Mário de Carvalho.

    Abraço

    o uno e o multiplo

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